
Foi-se-me pouco a pouco amortecendo
A luz que nesta vida me guiava,
Olhos fitos na qual até contava
Ir os degraus do túmulo descendo.
Em se ela anuviando, em a não vendo,
Já se me a luz de tudo anuviava;
Despontava ela apenas, despontava
Logo em minha alma a luz que ia perdendo.
Alma gémea da minha, e ingénua e pura
Como os anjos do céu (se o não sonharam...),
Quis mostrar-me que o bem bem pouco dura!
Não sei se me voou, se ma levaram...
Nem saiba eu nunca a minha desventura
Contar aos que inda em vida não choraram
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A vida é o dia de hoje,
A vida é ai que mal soa,
A vida é sombra que foge,
A vida é nuvem que voa;
A vida é sonho tão leve
Que se desfaz como a neve
E como o fumo se esvai:
A vida dura um momento,
Mais leve que o pensamento,
A vida leva-a o vento,
A vida é folha que cai!
A vida é flor na corrente,
A vida é sopro suave,
A vida é estrela cadente,
Voa mais leve que a ave:
Nuvem que o vento nos ares,
Onda que o vento nos mares,
Uma após outra lançou,
A vida – pena caída
Da asa de ave ferida -
De vale em vale impelida,
A vida o vento a levou!
Como em sonhos o anjo que me afaga
Leva nas Tranças os lírios que lhe pus,
E a luz quando se apaga
Leva aos olhos a luz!
Levou, sim, como a folha que desprende
De uma flor delicada o vento sul,
E a estrela que se estende
Nessa abóbada azul;
Como os ávidos olhos de um amamnte
Levam consigo a luz que um terno olhar,
E o vento do levante
Leva a onda do mar!
Como o terno filhinho quando expira
Leva o beijo dos lábios maternais,
E à alma que suspira
O vento leva os ais!
Ou como leva ao colo a mãe seu filho,
E as asas leva a pomba que voou,
E o sol leva o seu brilho...
O vento ma levou!
E, Deus, Tu és piedoso,
Senhor! és Deus e pai!
E ao filho desditoso
Não ouves pois um ai!
Estrlas deste aos ares,
Dás pérolas aos mares,
Ao campo dás a flor,
Frescura dás às fontes,
O lírio dás aos montes
- E roubas-ma, Senhor!
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João de Deus in: Campo de Flores
E roubas-ma senhor
a mim não a vida, mas o amor....
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