quinta-feira, julho 30, 2009

No Entardecer dos Dias de Verão

No entardecer dos dias de Verão, às vezes,
Ainda que não haja brisa nenhuma, parece
Que passa, um momento, uma leve brisa...
Mas as árvores permanecem imóveis
Em todas as folhas das suas folhas
E os nossos sentidos tiveram uma ilusão,
Tiveram a ilusão do que lhes agradaria...
Ah, os sentidos, os doentes que vêem e ouvem!
Fôssemos nós como devíamos ser
E não haveria em nós necessidade de ilusão ...
Bastar-nos-ia sentir com clareza e vida
E nem repararmos para que há sentidos ...
Mas graças a Deus que há imperfeição no Mundo
Porque a imperfeição é uma cousa,
E haver gente que erra é original,
E haver gente doente torna o Mundo engraçado.
Se não houvesse imperfeição, havia uma cousa a menos,
E deve haver muita cousa
Para termos muito que ver e ouvir ...

Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XLI"
Heterónimo de Fernando Pessoa


Férias!

segunda-feira, julho 20, 2009

40 anos e um dia depois da alunagem

Um dia depois de completados 40 anos da alunagem americana, deixo aqui alguns dados interessantes sobre a "corrida espacial":

Primeiro Satelite: Sputnik I (1957)
Primeiro ser vivo não humano no espaço: Sputnik II - Laika (1957)
Primeiro ser humano no espaço: Vostok I - Yuri Gagarin (1961)
Primeira mulher no espaço: Valentina Tereshkova (1963)
Primeiro país a chegar à lua: Luna 2 (1959)
Primeira orbita lunar: Apollo 8 (1968)
Primeiro ser humano na lua: Apollo 11 (1969)
Primeiro veiculo tripulado na lua: Apollo 17 (1972)
Primeiro veiculo não tripulado na lua, controlado da terra: Lunokhod 1 (1970)
Primeira estação espacial: Soyos (1960)
Estação espacial com mais tempo: MIR (1986)

Engraçado toda esta corrida multipartida, provocou grandes avanços na vida quotidiana, houve avanços até que foram uteis para o futuro como no caso do Lunokhod,
que voltou a ser utilizado como fonte de experiencia para a exploração de Marte, ou como o caso da MIR que voltou a ter forte impacto aquando da criação da estação espacial internacional.

Por fim fica aqui um belo poema sobre a exploração lunar:

Niels Armstrong pôs os pés na Lua
e a Humanidade inteira saudou nele
o Homem Novo.
No calendário da História sublinhou-se
com espesso traço o memorável feito.

Tudo nele era novo.
Vestia quinze fatos sobrepostos.
Primeiro, sobre a pele, cobrindo-o de alto a baixo,
um colante poroso de rede tricotada
para ventilação e temperatura próprias.
Logo após, outros fatos, e outros e mais outros,
catorze, no total,
de película de nylon
e borracha sintética.
Envolvendo o conjunto, do tronco até os pés,
na cabeça e nos braços,
confusíssima trama de canais
para circulação dos fluidos necessários,
da água e do oxigénio.
A cobrir tudo, enfim, como um balão de vento,
um envólucro soprado de tela de alumínio.
Capacete de rosca, de especial fibra de vidro,
auscultadores e microfones,
e, nas mãos penduradas, tentáculos programados,
luvas com luz nos dedos.

Numa cama de rede, pendurada
da parede do módulo,
na majestade augusta do silêncio,
dormia o Homem Novo a caminho da Lua.

Cá de longe, na Terra, num borborinho ansioso,
bocas de espanto e olhos de humidade,
todos se interpelavam e falavam
do Homem Novo,
do Homem Novo,
do Homem Novo.

Sobre a Lua, Armstrong pôs finalmente os pés.
Caminhava hesitante e cauteloso,
pé aqui,
pé ali,
as pernas afastadas,
os braços insuflados como balões pneumáticos,
o tronco debruçado sobre o solo.

Lá vai ele.
Lá vai o Homem Novo
medindo e calculando cada passo,
puxando pelo corpo como bloco emperrado.

Mais um passo.
Mais outro.
Num sobrehumano esforço
levanta a mão sapuda e qualquer coisa nela.
Com redobrado alento avança mais um passo,
e a Humanidade inteira,
com o coração pequeno e ressequido,
viu, com os olhos que a terra há-de comer,
o Homem Novo espetar, no chão poeirento da Lua, a bandeira da sua Pátria,
exactamente como faria o Homem Velho.

António Gedeão : Poema do Astronauta (Poema do homem novo)

De salientar ainda:
- Sergey Pavlovich Korolyov (Cérebro do programa espacial Soviético)
- Wernher von Braun (Responsável pelo desenvolvimento do V-2 Nazi, e posteriormente principal responsável do programa espacial Americano)
- Alexander Kemurdzhian (Responsável pelo programa espacial robotico Soviético)

sábado, julho 11, 2009

Pescador

I

Marinheiro que tanto mistério abrigas, observa o mar,
Na sua constante luta, entre duvidas e certezas num constante digladiar
E tu vais também oscilando entre a mentira e a verdade
De uma moeda, de uma mesma realidade
Varias entre um gélido calor infernal, que tudo liquefaz
E um frio, que de tão quente tudo gela tudo mordaz


II

Que oscilação, pensas, tão puramente pungente,
Tão louca e sem sentido, tão inconsequente

E voltas ao divagar, vacilas entre a mais fervorosa alegria
E um choro triste, penoso, e por vezes comovente,
Uma felicidade que na verdade é ausente
Quando se condescende ao suplicia da dor.


III

Que intempérie tempestuosa… Hoje o mar encontra-se revoltado,
Será apenas contigo pescador que se encontra zangado?
Sopra um vento forte que trespassa o espectro morto, feito de matéria inanimada
E tu balanças-te à sorte numa insegura corda bamba, sobre o cordel feito de nada
E de outra perspectiva, és ironicamente, és sarcasticamente controlado, pelos próprios
Fios, atilhos, baraços, linhas, guitas, redes, malhas, chama-lhe o quiseres
Manipulam-te como a um fantoche, uma marioneta
E ainda assim julgas-te capaz de escrever, escrita de poeta


IV

Embalas de novo numa frenética vontade, num infinito querer
E regressas em seguida ao mais singelo, não saber o que pretender
E como numa onda, leva-te o mar a um sábio e profundo saber
E retorna-te em seguida à ignorância ou frustração, à insipiência, talvez ao ser


V

E tu bem sabes, que no momento em que o silencio voltar
Em que a tua constante duvida que se confunde com a do mar
Quando a mesma for resolvida, dissipada, respondida
Ou terás chegado a bom porto, ou parte integrante dele serás
Sim, do mar, desse que está tão ruidoso e zangado, tão irado
Mas nessa altura, tal como tu, estará silencioso e sossegado
Envolto em mistério, calmo, tranquilo e calado.

sexta-feira, julho 10, 2009

Marasmo

Deambulo entre o sentido do sentir
E a falta do mesmo em tudo o que digo
Alterno entre o triste, desconsolado
O frustrado, o solitário, o inanimado

Sinto-me cansado, como se transportasse um peso
Que não suporto aos meus ombros
Levanto-me na tentativa de não deixar morrer
O gesto que tenta alcançar-me

E em seguida fecho os olhos e deixo-me diluir
Perco o ser ou o sentir algures,
No acto de tentar vislumbrar-me no vazio
Fecho os olhos e subitamente desfaço-me
Diluo o que sou na realidade que me rodeia

E ou morri, ou de certo que me perdi
Já não sei quem ou o que sou,
Nem que limites me definem
Se é que alguma vez me defiram

Não sei o que hei-de sequer procurar
Sei simplesmente que não reconheço
Aquele que observo no reflexo
Não sei quem és, ou quem sou

E não, não é amnésia do que sofro
Apenas da falta de identidade que me defina
Ou que me redefina que esta não a reconheço
Nem pretendo sequer tentar sê-la, estou moribundo.


Bom fim de semana